Antes de responder a pergunta que dá título a este artigo, quero terminar o assunto que comecei no artigo anterior..
Seja como for, todas as "realidades" e as fantasias" só podem tomar forma através da escrita, na
qual exterioridade e interioridade, mundo e ego, experiência e fantasia aparecem compostos pela mesma
matéria verbal; as visões polimorfas obtidas através dos olhos e da alma encontram-se contidas nas linhas
uniformes de caracteres minúsculos ou maiúsculos, de pontos, vírgulas, de parênteses; páginas inteiras de
sinais alinhados, encostados uns nos outros como grãos de areia, representando o espetáculo variegado do
mundo numa superfície sempre igual e sempre diversa, como as dunas impelidas pelo vento do deserto.
(Ítalo Calvino - Seis Propostas para o Próximo Milênio - São Paulo, Companhia das Letras, 1990)
Neste espaço introdutório, vamos enumerar alguns pressupostos básicos necessários
para uma boa produção textual, independentemente da modalidade escolhida.
Vamos,
também, relacionar tais pressupostos com sugestões que lhes facilitem a compreensão e a
operacionalização.
Leia e releia cada uma das orientações, sem se preocupar com detalhes sobre a forma
de viabilizá-las, na especificidade de cada tipo de texto redigido.
Seu conteúdo será retomado
ao longo de toda a apostila, nos verbetes e tópicos apresentados.
Ter o domínio correto da língua e o conhecimento de seus mecanismos básicos, em termos
de estrutura / coerência / vocabulário / clareza / correção de linguagem.
Para atingir este pressuposto, é necessário familiarizar-se com a língua escrita culta, o
que conseguimos por meio da leitura de diversos tipos de textos e também da consulta
sistemática a gramáticas e dicionários.
Ter a capacidade de deflagrar e de organizar ideias: saber conjugar "inspiração" e
"transpiração".
Organizar as ideias, necessariamente, opõe-se à fragmentação com que aparecem em
nossa mente.
Pensamos numa velocidade e escrevemos em outra. Precisamos, então, para
escrever, por um lado permitir e incentivar o fluxo de nossas ideias, e por outro organizá-las,
isto é, perceber e explicitar as relações que há entre elas.
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Para a realização eficiente deste processo, é necessário primeiro respeitar os
mecanismos da chamada "inspiração", ou seja:
MOMENTO CRIADOR: INSPIRAÇÃO
"
Não inibir o que vem à mente a partir da necessidade de escrever algo, seja o que for.
"
Rascunhar o que for aparecendo com a preocupação única de ser fiel ao fluxo de
percepções, intuições, divagações, sentimentos, pensamentos etc, deflagrados pelo tema
proposto (lembre-se de que "palavra-puxa-palavra": você precisa conquistar um ritmo de
desenvoltura e de familiaridade com a palavra escrita, para que por meio dela se perceba mais
criativo; suas palavras, liberadas, podem surpreender-Ihe positivamente a autoimagem,
enquanto ser capaz de expressão, de comunicabilidade e, portanto, de linguagem).
"
Transformar em hábito tal procedimento, sistematicamente anotando observações, insights e
opiniões sobre o que acontece de interessante no cotidiano, seja em experiências vividas, seja
em leituras, em contato com as pessoas, a TV, o cinema etc.
MOMENTO DE ARQUITETURA: "TRANSPIRAÇÃO"
Em seguida, é hora da "transpiração": a montagem do texto, a escolha do que deve
ficar e do que deve sair; se necessário, acrescente algumas coisas e retire outras, "enxugando"
e "refinando" o que escreveu.
Consulte uma gramática e um dicionário para a realização da
tarefa. Após esta seleção, ordenar as frases, fundamentalmente a partir de dois critérios:
"
Perceber a diferença entre o principal e o secundário, hierarquizando a sequência de
parágrafos de modo a tornar claro, legível e interessante o seu texto ao leitor.
"
Saber conciliar ponto de vista, opinião, tomada de posição com argumento, fundamentação,
subsídio para que aquilo que você viu, relatou ou questionou tenha consistência fora de você,
isto é, possua vínculo lógico com o real e ao mesmo tempo possa despertar prazer em quem
lê.
Seja num tipo de percepção sobre um determinado objeto que pretende descrever, seja
no sentido de um evento real ou imaginário que almeja narrar, seja numa tese que gostaria de
defender, isto é, na Descrição, na Narração e/ou na Dissertação, a base do bom texto está no
equilíbrio entre afirmar (ou sugerir) e subsidiar com elementos pertinentes a afirmação."
Pensar criadoramente, com lógica; criar logicamente, com imaginação: nunca devemos nos
esquecer de que fazer um bom texto dissertativo ao mesmo tempo deve convencer (por meios lógicos) e
persuadir (por meios retóricos), quer dizer, deve chegar à razão, à inteligência, e também ao
coração, aos sentimentos.
Por isso, não podemos separar uma coisa da outra; ao contrário, é
fundamental saber conjugar lucidez e poesia, lógica e criação.
Assim, o que temos a expressar
revela ao mesmo tempo saber e sabor, o que seduz e portanto engaja quem nos lê ao nosso
texto.
"
Adquirir e/ou depurar uma constante prática de leitura: o ato de escrever está muito ligado ao
ato de ler.
Ambos devem ser realizados de maneira crítica, atenta, quer dizer, não mecânica
nem passiva, tomando-se o leitor um criador, capaz de pensar por si mesmo e ao mesmo
tempo de dialogar criticamente com o que lê para produzir o seu texto.
"
Relacionar texto e contexto, ou seja, o tipo de texto a ser produzido precisa ser compatível
com a situação concreta que deflagra a sua produção.
Assim, ao fazermos um relatório, um
memorando, uma circular etc, devemos cuidar sobretudo da precisão do vocabulário, da
exatidão dos pormenores e da sobriedade da linguagem.
Por outro lado, ao realizarmos uma
narração imaginativa: (por exemplo para criar um texto publicitário, ou de ficção), a elegância e
os requisitos da expressividade linguística - como os tons afetivos e as explorações de polissemia - são prioridades.
Entretanto, estas coisas não são estanques: o esclarecer
convencendo e o impressionar agradando andam juntos, como veremos ao longo de todo o
livro.
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